Existe uma crescente discussão acerca de diversidade e inclusão em várias áreas, até porque o Brasil, naturalmente, é um país diverso e com uma multiplicidade de grupos sociais. Mas a verdade é que esse caminho, dentro do campo tecnológico, é uma realidade há muito tempo, principalmente para quem depende exclusivamente da tecnologia para executar atividades básicas do dia a dia. Nesse sentido, a Tecnologia Assistiva e Design Inclusivo são caminhos possíveis.
Entretanto, falar desses temas nos leva, quase automaticamente, a pensar em recursos complexos. Adentrar nesses assuntos à nível Brasil é basicamente um pensar excludente, que invisibiliza realidades e desigualdades inegáveis do nosso país.
No campo da educação, por exemplo, esse assunto permeia possibilidades tecnológicas variáveis. Ao falar no conceito de Tecnologia Assistiva*, estamos nos referindo a produtos, recursos, metodologias, estratégias, práticas e serviços que objetivam promover a usabilidade relacionada à atividade e participação de pessoas com deficiência, incapacidades ou mobilidade reduzida, visando sua autonomia, independência, qualidade de vida e inclusão social.
Apenas a partir dessa perspectiva já é possível verificar um leque de oportunidades para se criar e desenvolver produtos e serviços em prol às pessoas. Os resultados disponibilizados pelo Censo Demográfico de 2010 realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que buscou identificar as deficiências visual, auditiva, motora e intelectual da população brasileira, apontam que 45,6 milhões de pessoas – valor equivalente a 23,9% da população – declararam ter ao menos uma dessas deficiências.
A expressividade dos números apresentados pelo IBGE (2010) reforça a necessidade de ações de reparação da desigualdade. A antropóloga e professora universitária, Débora Diniz (2007), estabelece que “o desafio está em afirmar a deficiência como estilo de vida”, pois ela ainda é tratada a partir de estereótipos estigmatizantes e apontada como um drama pessoal, ao invés de ser vista como uma questão de isonomia social.
No que tange às questões de isonomia social, a área de TI tem um importante papel e pode servir como agente transformador dessas realidades. Os profissionais que exercem funções de criação e desenvolvimento podem se preocupar em tornar a diversidade e a inclusão uma lupa que direciona o seu olhar para as mais variadas realidades da sociedade.
Compreender os caminhos que já são possíveis, dentro da tecnologia, e viabilizar as diversas formas de acessibilidade a partir da transformação digital, onde cada vez mais softwares e hardwares estão sendo pensados para facilitar o dia a dia de todas as pessoas, são os primeiros passos para fomentar que produtos digitais acessíveis e realmente inclusivos façam parte da realidade brasileira.
Dentro do campo de estudos do Design, considerar a importância de visar a inclusão da diversidade social, suas variações e abranger nas capacidades, necessidades e aspirações – sem adaptação especial ou aplicação especializada de produtos e serviços – enquadra-se na perspectiva de Design Inclusivo (CLARKSON et. al, 2007).
Esse conceito aplicado ao desenvolvimento de produtos e serviços “trouxe a consciência sobre a importância do design para a inclusão das pessoas com incapacidade” (BISPO, 2018), do mesmo modo que pode impactar na mudança de mentalidades e no combate aos estereótipos estigmatizantes. Esses não só dizem respeito às pessoas com deficiência, mas sim à toda uma população que encontra-se excluída ou segregada pelo desenvolvimento de projetos que não visam a reflexão sobre as suas existências antes mesmo da etapa de ideação de um produto digital.
É importante lembrarmos dos recursos já existentes que tornam os produtos mais inteligentes, acessíveis e inclusivos como, por exemplo, a tecnologia de reconhecimento de voz. Ela permite a automação por comando de voz e facilita o controle de máquinas e equipamentos por pessoas com limitações de mobilidade.
Outro exemplo é a estruturação de formulários que possuam campos identificáveis e possíveis de interação para usuários com baixa visão ou cegos. Do mesmo modo, que validem a pertinência de questionar o usuário sobre informações mais pessoais como, por exemplo, identidade de gênero e orientação sexual. Essas últimas, se fazendo necessárias para aquilo que deseja-se obter, precisam contemplar a diversidade humana e possibilitar que as pessoas sintam-se confortáveis e que não sejam induzidas a marcar opções por mera burocracia e por lógicas binárias de existência.
De forma geral, todas essas questões fazem parte da estruturação e desenvolvimento de recursos orientados à diversidade e inclusão, e que promovem a humanização, reconhecimento e emancipação através de recursos tecnológicos, feitos por pessoas para pessoas. Precisamos evoluí-las continuamente, incentivando times a questionar o quão diversos e inclusivos são os produtos e serviços digitais que criam.
*Conceito definido pelo Comitê de Ajudas Técnicas – CAT do Ministério da Ciência e Tecnologia do Brasil (2007).
Bispo, R. J. C. L. (2018). Design contra o estigma (Tese de doutoramento, Universidade de Aveiro). Disponível em https://ria.ua.pt/handle/10773/24793
Diniz, D. (2007). O que é deficiência. São Paulo, Brasil: Brasiliense.
11 de abril de 2024
20 de junho de 2023