- Inovação
No início de maio, o Rio de Janeiro recebeu a primeira edição do Web Summit na América Latina, também primeira fora da Europa. Durante os quatro dias de evento, mais de 21 mil participantes, 900 startups e 400 palestrantes transitaram pelos pavilhões do Riocentro (espaço localizado na Barra da Tijuca, zona oeste da capital carioca), para discutir diversos temas ligados à área de tecnologia, incluindo IA Generativa.
Esse movimento de trazer o evento para o Brasil, em especial para o estado do Rio, promete ser muito importante para o ecossistema de startups brasileiras, e vem para destacar o país como um expoente em inovação. Durante a palestra Agora é hora de investir na América Latina, Aron Schwarzkopf, CEO da Kushki e especialista em Venture Capital, citou que “a grande adoção de métodos de pagamento na América Latina, em especial no Brasil, mudou a direção das ondas para o investimento em empresas brasileiras”.
Apesar das adversidades esperadas de uma primeira edição, o evento foi considerado um sucesso pelo público. O Estado do Rio de Janeiro já selou o compromisso de realizar mais cinco edições da conferência na cidade, com expectativas ainda maiores: a promessa é de movimentar, até 2028, R$ 1,2 bilhões e trazer incentivos para a instalação de empresas e startups na capital carioca.
Dentre os assuntos mais falados estiveram Criptomoedas, Cyber Security, Comércio Eletrônico, Agritechs e o futuro da educação e do trabalho. O destaque, entretanto, ficou para os debates sobre Inteligência Artificial Generativa e Criatividade.
A Inteligência Artificial Generativa é um tipo de tecnologia capaz de criar resultados originais com base em dados pré-estabelecidos, podendo desenvolver conteúdos em diversos formatos como imagens, textos e vídeos. Diferente dos modelos de inteligência tradicionais, que são programados para receber, reconhecer padrões e fazer previsões, a IA Generativa é capaz de aprender e melhorar seu desempenho por meio de interações com usuários.
Com o ChatGPT em alta, não foi surpresa que esse tenha sido o assunto presente na maioria dos debates do Web Summit Rio. O tema já tinha sido comentado em outras edições e também no SXSW deste ano, mas agora o foco é imediato. Já que o GPT e o Bard estão consolidados no mercado, a pergunta não é mais o que vai acontecer, e sim, “Para onde vamos a partir daqui? Quais as medidas e caminhos devemos tomar? Quais são as possibilidades?”.
No painel A Inteligência Artificial Generativa vai transformar o marketing e a propaganda? os palestrantes brincaram com o fato da pergunta título não fazer mais sentido, pois ela já vem transformando. Daniela Braga, CEO e fundadora da Defined.ai, tem uma visão otimista sobre o assunto e garante que estamos em um dos momentos mais relevantes para a Inteligência Artificial. “Nós estávamos vivendo uma primavera da IA, que durou quase 10 anos. Agora, é a vez do verão”.
Ela completou dizendo considerar que estamos vivendo a próxima revolução industrial, e ela será indispensável para todos os setores da indústria. A IA Generativa se tornará o que é a Internet nos dias de hoje. “Vai afetar todo mundo, em todos os segmentos”.
Além das discussões mais filosóficas, que questionaram o futuro, também foi possível acompanhar demonstrações da IA Generativa na tecnologia. Em Como construir um aplicativo em 18 minutos, Thomas Dohmke, presidente-executivo do GitHub, criou uma versão funcional do conhecido ‘jogo da cobrinha’.
A demonstração foi feita no palco principal do evento, utilizando uma ferramenta da empresa que completa códigos iniciados por programadores. Chamada Copilot, a plataforma foi treinada a partir dos códigos e textos dos usuários do GitHub e é constantemente abastecida pelo GPT-4.
Apesar das visões mais otimistas sobre o tema, Meredith Whittaker, presidente da Signal Foundation, acredita que devemos frear o desenvolvimento dessa tecnologia. No painel Por que precisamos frear o desenvolvimento da IA, a ativista na causa e uma das assinantes da carta para interromper os avanços recentes em Inteligência Artificial, disse acreditar que devemos nos preocupar com a facilidade em obter dados com a IA. Ainda, afirmou que esse mercado é muito concentrado, o que significa que apenas grandes empresas têm os recursos para continuar com o desenvolvimento.
Um ponto de consenso entre os diversos palestrantes é a necessidade de regulamentação urgente e a preocupação com a questão de privacidade. Para Chelsea Manning, Consultora de Segurança na Nym, é necessário que exista uma contribuição de toda comunidade tecnológica nessa discussão, pois é preciso entender melhor os impactos da IA Generativa, antes de limitá-la.
No painel IA é melhor com privacidade, Manning afirmou que é importante que a regulamentação seja específica para cada caso, de acordo com o risco envolvido, pois apesar de indispensável, ela não pode limitar o surgimento de inovações.
Com a IA Generativa aprendendo, reproduzindo e remixando, a criatividade aparece como diferencial essencial aos profissionais atuais. Por isso, o tema teve dois palcos específicos no Web Summit Rio, que reuniram variados debates sobre a área criativa.
Considerada como uma das principais habilidades do futuro do trabalho, muitos especialistas questionaram o que estamos realmente produzindo e como estamos produzindo. Alain Sylvain, da consultoria de design e estratégia Sylvain, trouxe como provocação o questionamento: “Será que nós, enquanto sociedade, não estamos supervalorizando a criatividade?”.
Segundo ele, apesar das centenas de livros, aplicativos, prêmios, tempo e dinheiro investido, não estamos realmente vendo o retorno em relação à inovação e resultado. Como exemplo, ele traz desenvolvimentos recentes em moda, cinema e até mesmo a baixa recente em dados de patentes nos EUA.
Para Sylvain, criatividade é sim importante, mas ela sozinha não garante sucesso, por isso, é sempre importante considerar o timing. Ele acredita que mesmo as melhores ideias, se forem lançadas antes ou depois do momento certo, dificilmente terão sucesso. Trazendo o conceito de Peak Innovation, ele aponta que três fatores definem o momento certo para uma ideia: o contexto cultural, o desejo dos indivíduos por aquele produto/serviço e a infraestrutura tecnológica para viabilizá-lo.
O especialista apontou que diversas descobertas já estavam por aqui há algum tempo, mas precisaram aguardar o momento certo para alcançar o seu pico, como o elevador, o QR Code e o próprio ChatGPT. Para fechar, ele completou afirmando que nossa criatividade existe num espaço de tempo, e é preciso não desconsiderar o contexto durante a produção.
Outro destaque do evento foi a participação de Brian Collins, diretor criativo da COLLINS, que comandou a palestra Regras de Design para provocar a criatividade. Ele defendeu que todo trabalho deveria ser significante, original e surpreendente, e criticou o uso do MVP (Produto Mínimo Viável) em áreas criativas e por profissionais de marketing, afirmando que isso faz com que muitos trabalhos mirem a conformidade.
Como mudança de mindset, Collins defende que todo trabalho criativo deve ter storytelling, intencionalidade e surpresa. Ele inclusive fechou sua palestra com a frase: “Torne o futuro tão irresistível que ele se torne inevitável”.
O termo MVP foi popularizado na área de tecnologia por Steve Blank e Eric Ries, para definir a mínima versão de um produto que possui os recursos suficientes para ser usado pelos primeiros clientes, com o objetivo de colher feedback para o seu desenvolvimento. Para entender mais sobre esse assunto, você pode conferir o artigo MVP: Experimentação e Aprendizado.
A área criativa é uma das mais preocupadas com o avanço da IA Generativa e com a falta de regulamentação sobre a produção. Além do medo de futuramente perder o emprego para a tecnologia, profissionais se perguntam quem detém os direitos sobre os conteúdos gerados. De quem são os direitos autorais pelos conteúdos gerados em IA? Os dados da base que a geraram? Quem fez a pergunta?
No painel sobre Marketing e Inteligência Artificial, Daniela Braga e Fernando Machado, CMO da NotCo, concordaram que a tecnologia não vai substituir diretamente o emprego das pessoas, mas é necessário se manter atualizado e aprender a utilizá-la. Apesar da geração de conteúdo ser um dos principais usos da IA, ainda será necessário ter um ser humano no processo de criação. “Embora seja possível criar música, imagens e uma infinidade de coisas com IA, é fundamental ter um ser humano no processo de criação”, garante Daniela.
Durante a conversa, Fernando Machado também ressaltou o avanço da tecnologia, que antes servia como uma ’curadoria de conteúdo’ e hoje é uma ferramenta de produção. Entre grande parte dos palestrantes, parece ser unânime que a IA vai permitir que as empresas produzam cada vez mais, com menos recursos. Para eles, a palavra-chave é produtividade.
Apesar de muitas discussões do evento ficarem em aberto, o saldo final é a garantia que a IA Generativa não é apenas uma promessa ou tendência, mas uma realidade em diversas áreas e negócios. Mais do que isso, ela anda de mãos dadas com a criatividade e o fator humano, possibilitando o desenvolvimento de soluções e possibilidades mais relevantes.
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