Em fevereiro de 2001, nas montanhas de Wasatch (Utah – EUA), dezessete consultores se reuniram para discutir métodos de trabalho da área de tecnologia, visando encontrar um terreno comum ao desenvolvimento de software. Essa Conferência deu origem ao Manifesto Ágil, movimento que transformou a TI e guia até hoje a forma como são criados produtos e serviços digitais.
Nosso agilista Raphael Rodrigues aproveitou o espaço do SoftDrops* para contar um pouco dessa história, destacar os princípios do Manifesto e explorar as características do Método Ágil. Abaixo, compartilhamos os itens mais importantes da sua apresentação.
Entre os consultores presentes na Conferência de fevereiro de 2001, Raphael destacou: Kent Beck, Rod Jeffries e Ward Cunningham, criadores do Extreme Programming (XP); Ken Schwaber e Jeff Sutherland, criadores do Scrum; Alistair CockBurn, criador do Crystal Clear; Martin Fowler, autor de importantes livros sobre padrões de projetos e UML; e Robert C. Martin, escritor de livros fundamentais sobre programação e clean code.
Entretanto, é preciso pontuar que antes do encontro, o tema melhorias de processos já estava em discussão na área de produto. Alguns dos Métodos Ágeis citados no parágrafo anterior deram seus primeiros passos antes mesmo da Conferência.
Mas vale destacar que em 1945, William Edwards Deming revolucionou os processos produtivos no Japão e nos Estados Unidos propondo aplicação de métodos estatísticos (grande influenciador do Toyota Production System); e Hirotaka Takeuchi e Ikujiru Nonaka, que em 1986 criaram a abordagem New Product Development Game, agilizando e flexibilizando o desenvolvimento de produtos (em empresas como Canon, IBM, 3M, entre outras).
Com todas essas iniciativas acontecendo ao longo do tempo, qual foi a então a motivação para a Conferência de fevereiro de 2001? Os consultores envolvidos estavam buscando um modelo comum, uma alternativa aos processos de desenvolvimento de software que, estruturados no Método Cascata/Waterfall (criado dentro da área de Engenharia), eram considerados pesados e demasiadamente orientados à documentação.
Esse Encontro deu vida a Agile Alliance, que ainda hoje dita e contribui com a organização dos processos da área; e originou o Manifesto para o Desenvolvimento de Software Ágil, com sua mentalidade, valores e princípios. Tais valores fornecem orientação sobre como criar e responder a mudanças, e sobre como lidar com incertezas:
“Essa forma de trabalho é baseada em empirismo. Então o que nós fazemos hoje é um método científico no qual não sabemos a verdade, o que vai surgir durante o processo. Antes (no Waterfall), o que fazíamos era planejar e seguir o plano, documentando as etapas conforme o programado. Com o Método Ágil, assumimos hipóteses, realizamos experimentos e testamos para validar, o que gera grande aprendizado”, explicou Raphael.
A Conferência impactou os anos seguintes e impulsionou o surgimento de diversas modelos de trabalho como o Test-Driven Development (TDD); o Lean Software Development, o Large Scale Scrum (LeSS), o Kanban Software Development, o DevOps, o Mob Programming e o Disciplined Agile Delivery (DAD), entre muitos outros.
São quatro os valores fundamentais do Manifesto Ágil, que passaram a ser valorizados após fevereiro de 2001 nas práticas de desenvolvimento de software:
– Indivíduos e interações mais do que processos e ferramentas;
– Software em funcionamento mais do que documentação abrangente;
– Colaboração com o cliente mais do que negociação de contratos;
– Responder a mudanças mais do que seguir um plano.
Raphael explicou que é preciso entender que não significa que os itens à direita não sejam importantes e não devam ser realizados, mas sim que nessa adaptação de mentalidade, eles são inferiores aos itens à esquerda, que devem ser priorizados. Tais valores resumem os 12 Princípios Ágeis que podem ser vistos na imagem abaixo – os quatro primeiros são voltados aos clientes; os quatro seguintes à gestão, e os quatro finais ao time:
A agilidade é um grande guarda-chuva que abarca diversas práticas, desde processos mais leves para times pequenos, quanto processos mais robustos para times maiores. Podemos citar Scrum, Kanban, XP, TDD e Crystal como abordagens leves, e LeSS, DAD, Agile Project Management (Agile PM) e Open Unified Process (OpenUP) como abordagens mais pesadas, por exemplo.
Para Raphael, os Métodos Ágeis são convenções que as equipes escolhem seguir. “Se o time está trabalhando segundo os princípios ágeis, eles estão, sim, tentando ser ágeis. O que importa não é o framework (Scrum, Kanban, etc.), mas sim os acordos que são realizados dentro do time. O framework traz uma condensação de ideias que funcionaram, mas ele precisa ser adaptado ao contexto e realidade de cada equipe”.
Nesse sentido, é importante salientar que é possível utilizar diversas práticas no mesmo projeto. Não é imprescindível seguir somente um framework do início ao fim, mas sim utilizar práticas que gerem os melhores resultados naquele caso. Inclusive, na imagem abaixo, podemos observar como as diferentes práticas dos frameworks podem interagir.
Mesmo com muitas mudanças no mundo, pela observação do agilista é possível enxergar um movimento crescente de práticas ágeis em contextos fora do desenvolvimento de software ou da construção de produtos, onde há maior integração com práticas de design. E, ainda, em áreas como marketing e RH – esse último inclusive já tem seu próprio manifesto.
Para Raphael, o futuro do que chamamos de agilidade está mais relacionado a melhores práticas de gestão, de liderança e de cultura organizacional, com foco em colaboração e desenvolvimento de pessoas – sendo pragmático a frameworks ou métodos. Assim, a criação de produtos estará concentrada para clientes, e há importância no fluxo de valor de ponta a ponta.
22 de agosto de 2023