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IA na engenharia de software: o que muda (e o que não) na gestão de projetos 

Por 26/11/2025 26/11/2025 11 minutos

IA na engenharia de software está em todo lugar — e, com ela, vem a sensação de que precisamos reinventar a gestão de projetos. Na SoftDesign, trouxemos esse debate para perto em uma palestra com o Dr. João Pablo Silva da Silva, Professor Adjunto de Engenharia de Software da Universidade Federal do Pampa (Unipampa).

A provocação foi direta: continua sendo engenharia de software. Em vez de trocar fundamentos, ajustamos como decidimos, aprendemos e tornamos o progresso visível — com IA como alavanca, não como atalho mágico.

Neste artigo, você vai ver o que muda e o que não muda quando aplicamos IA no dia a dia: decisão aumentada (comparar alternativas com critérios e registrar os porquês), progresso visível (evidências objetivas por tipo de trabalho), qualidade sem drama (testes orientados a risco, documentação viva e participação ativa de QA) e noções de governança (onde usar, onde não usar e como medir impacto).

A diferença é de prática: as ferramentas evoluíram; os princípios continuam guiando.

O que não muda (e por que isso é bom)

Projetos de software continuam apoiados sobre a mesma espinha dorsal: entender o problema com profundidade, desenhar uma solução que faça sentido, implementar com disciplina e testar de forma responsável. Essa sequência não é ritual; é a forma mais eficiente de reduzir incerteza sem abrir mão de valor. IA não derruba essa estrutura — ela pode, no máximo, encurtar alguns caminhos sem mudar o destino.

O papel do gestor também permanece o mesmo: tomar decisões sob incerteza. Ferramentas ajudam a coletar dados, organizar insumos e sugerir alternativas, mas a responsabilidade pelo “porquê” permanece humana. É o gestor quem conecta estratégia e execução, quem diz “não” quando a tentação do brilho tecnológico desvia a energia do time e quem segura a bússola quando a pressão por velocidade aumenta.

Qualidade contínua é inegociável. Critérios de aceitação claros, segurança, privacidade, legibilidade do código e testes bem pensados são o que mantém o software de pé quando a complexidade surge. A Inteligência Artificial pode ajudar na geração de cenários e documentação, mas não substitui a atenção aos detalhes que evita que um avanço de hoje se transforme em dívida de amanhã.

Por fim, os métodos continuam servindo ao mesmo propósito: criar ciclos de feedback que reduzem risco. Scrum, Kanban, Lean — nenhum deles “resolve IA”. O que fazem é estruturar conversas melhores: menos achismo, mais observável; menos status, próximo passo mais claro. É aqui que a IA entra bem: não para trocar o método, mas para iluminar melhor as decisões dentro dele.

“Fundamentos não caducam com tecnologia nova; eles só ficam mais valiosos. Requisitos claros, arquitetura com intenção e testes responsáveis continuam sendo o menor custo para reduzir incerteza — e a decisão final segue humana. Métodos dão cadência; a IA, quando bem usada, dá nitidez” — Prof. João Pablo.

O que muda com IA (do jeito certo) 

A primeira mudança é na capacidade de raciocínio do time. Com IA, é possível explorar alternativas mais rápido, comparar cenários com critérios explícitos e enxergar implicações antes do commit. Isso não significa terceirizar a decisão, e sim enriquecer a deliberação. Quando registramos as premissas, os critérios e os riscos aceitos, transformamos cada escolha em memória útil para a próxima.

A segunda mudança é no mix de esforço. Tudo que é repetitivo e estável migra naturalmente para automação assistida. Sobra espaço para o que é genuinamente humano: compreender o domínio, desenhar interfaces que façam sentido, negociar trade-offs e tomar decisões de arquitetura com intenção. Equipes que entendem isso produzem menos volume gratuito e mais decisão que impactam resultado.

A terceira mudança aparece na predição e no tratamento de riscos. Cruzar histórico de defeitos, dependências técnicas e sinais de uso com apoio de IA reduz assimetrias de informação. Em vez de surpresas no fim da sprint, surgem ajustes cedo e baratos. O risco não desaparece, mas muda de lugar: deixa de virar incêndio e vira rotina de higiene.

A quarta mudança está no jeito de testar e documentar. Documentos passam a ser vivos e mínimos, muitas vezes começando com um rascunho gerado por IA e sendo lapidados pelo time. Testes se distribuem ao longo do fluxo: automação onde o comportamento é determinístico; exploração onde há incerteza e integração difícil. O compromisso com qualidade permanece; o percurso fica mais inteligente.

“IA é aumento de cognição e de visibilidade de risco — não é terceirização de responsabilidade. Ela amplia o horizonte de alternativas e evidencia trade-offs, mas o “sim” e o “não” continuam no nosso colo. Registrar os porquês transforma cada decisão em patrimônio da equipe” — Prof. João Pablo.

Progresso visível na prática

Em contextos com IA, “quantidade de cards movidos” não conta a história. O que ajuda é combinar: 1) tipo de trabalho (história, bug, débito técnico, spike), 2) o que significa avançar e 3) quais evidências esperamos ao final do incremento.

Quando o time fala a mesma língua sobre progresso, a conversa deixa o terreno das opiniões e passa para o campo do observável. Fica claro o que foi aprendido, o que ainda está em aberto e qual é o próximo passo.

Esse acordo muda o tom das cerimônias. A daily deixa de ser um tour de status para virar alinhamento real sobre bloqueios e decisões; a review mostra aprendizado, não só demo; a retro trata causas, não sintomas. O gestor não precisa caçar sinal de avanço: ele aparece porque foi previamente definido de forma simples e verificável.

No fundo, o que chamamos de “progresso visível” é uma linguagem comum. Ela evita que a IA seja usada para produzir mais do mesmo e incentiva a equipe para produzir melhor: menos rework, mais previsibilidade e uma sensação compartilhada de que as decisões estão avançando o produto na direção certa.

“Progresso visível é acordo sobre evidência — e acordo sobre evidência é gestão. Quando definimos o que significa avançar por tipo de trabalho e quais sinais vamos observar, a conversa sai do achismo. O time passa a discutir fatos e próximos passos, não opiniões” — Prof. João Pablo.

Qualidade sem drama

Qualidade continua sendo o que separa “funciona agora” de “continua funcionando quando o sistema crescer”. Com IA, o fluxo fica mais leve: documentação mínima e viva, iniciada por rascunhos gerados pela máquina e revisados por quem conhece o contexto; testes que combinam automação no que é estável com exploração onde a incerteza mora.

O QA deixa de ser a última etapa e passa a ser parceiro desde o começo, ajudando a transformar critérios de aceitação em realidade de uso. Isso não burocratiza: libera o time para acelerar com segurança, porque há acordo sobre o que “pronto” significa e sobre como validar continuamente esse “pronto”.

O efeito prático aparece rapidamente. Menos retrabalho porque as decisões carregam seus porquês; menos sustos porque os riscos são tratados enquanto ainda são pequenos; mais previsibilidade porque o progresso tem definição objetiva. A IA não resolve tudo, mas melhora a relação custo/benefício de decidir bem, aprender rápido e prevenir que um problema grande vire incêndio. No fim, seguimos engineering-first — agora com ferramentas melhores para honrar esse princípio.

“Testar e documentar não ficaram “velhos” com IA; ficaram mais inteligentes e distribuídos no fluxo. Documentos vivos e mínimos, rascunhados com apoio da máquina e lapidados pelo time, reduzem ruído. Qualidade nasce no começo — com QA dentro da definição de pronto” — Prof. João Pablo.

O que levar para a próxima sprint

Comece por clareza compartilhada. Em uma sessão de até 60 minutos, alinhe com o time o que significa progresso visível para cada tipo de trabalho (história, bug, débito técnico, spike).

Escrevam em frases curtas: qual é o objetivo daquele item, quais evidências observáveis indicam avanço ao fim do incremento (ex.: protótipo navegável, endpoint validado, regra de negócio confirmada) e qual próximo passo inequívoco precisa estar definido.

Transforme isso num quadro simples no repositório do time e trate como referência viva. A partir daí, as cerimônias deixam de girar em torno de opiniões e passam a conversar sobre fatos e decisões.

Em paralelo, institua a decisão aumentada como prática leve. Quando houver bifurcação relevante (A vs. B), peça que alguém rode um prompt padrão para comparar alternativas com critérios explícitos (valor para o usuário, custo, risco, impacto arquitetural) e, na daily ou no refinamento, o grupo delibera e registra os porquês num ADR curto (3–5 linhas).

Esse registro vira memória organizacional: evita voltas em falso, acelera onboarding e melhora a qualidade das discussões. A IA entra para encurtar o trabalho braçal (gerar rascunho, listar prós e contras, sugerir riscos), mas a decisão continua humana e contextual.

Por fim, feche o ciclo com checagens rápidas e métricas mínimas. Marque um checkpoint semanal de 10–15 minutos só para olhar riscos que emergiram e ajustar próximos passos. Acompanhe três sinais simples por duas sprints:

  1. % de itens que terminam com próximo passo claro;
  2. Tempo entre descoberta e decisão;
  3. Retrabalho por entendimento/arquitetura.

Se esses números melhorarem, você sentirá o efeito em previsibilidade e moral do time. Se não melhorarem, ajuste o acordo de progresso ou o roteiro de decisão aumentada. A regra é: evidência primeiro, ajuste depois.

Como a SoftDesign pode ajudar

Na SoftDesign, tratamos IA como alavanca de engenharia, não como atalho. Começamos pelo seu contexto e co-desenhamos uma estratégia de IA responsável: onde faz sentido aplicar (e onde não faz), quais decisões serão de pessoas e quais podem ser assistidas, como ficam governança, segurança e privacidade.

Do AI Discovery ao piloto, estruturamos decisão aumentada (ADRs leves com porquês claros), critérios de valor e um plano de rollout que respeita o ritmo do seu produto e as restrições do seu negócio.

No dia a dia, integramos IA no fluxo real de desenvolvimento: copilots para acelerar análise e código sem renunciar à revisão humana; QA aumentado (geração de casos e dados de teste, análise de falhas, triagem de flaky tests) com foco em testes orientados a risco; e observabilidade inteligente para antecipar problemas em produção.

Para times em modernização, combinamos arquitetura evolutiva com automação e MLOps leve quando há modelos no ciclo, sempre com métricas que importam: redução de retrabalho, previsibilidade e lead time de decisão.

Se você quer começar com segurança, oferecemos sprints de diagnóstico com IA (mapa de oportunidades + quick wins), assessment de qualidade e risco para IA (dados, compliance, modelos, prompts) e programas de habilitação de equipe focados em práticas sustentáveis.

Nada de pacotes engessados: trabalhamos junto com o seu time para manter a essência engineering-first enquanto a IA eleva a barra de decisão, qualidade e velocidade — com impacto visível já nas próximas sprints.

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Entre em contato e vamos conversar sobre seus desafios de TI.

Perguntas frequentes sobre IA na engenharia de software

Veja abaixo, respostas para algumas das principais dúvidas sobre o tema.

Como a inteligência artificial está transformando a engenharia de software?

Ela amplia a capacidade do time: acelera análise e codificação, compara alternativas com mais evidência, antecipa riscos por meio de sinais de produto/produção e deixa rastro de decisão (ADRs leves), mantendo o foco humano em design, arquitetura e priorização.

Quais são os benefícios de usar IA no desenvolvimento de software?

Menos retrabalho e mais previsibilidade; documentação viva com rascunhos rápidos; testes direcionados (priorização por risco); onboarding mais ágil; e ganho de velocidade nas etapas repetitivas, sem renunciar à revisão humana.

Quais são os desafios ao integrar IA na engenharia de software?

Governança e privacidade de dados, evitar dependência cega do “copiar/colar”, adaptar modelos ao contexto do domínio, criar trilhas de auditoria e promover a mudança cultural necessária para registrar porquês e medir impacto real.

A IA pode substituir engenheiros de software?


Não. Ela aumenta a cognição e a produtividade, mas não substitui julgamento, ética, entendimento de contexto e responsabilidade; o trabalho migra de tarefas repetitivas para decisões de arquitetura, critérios de qualidade e validação humana.

Quais tendências unem engenharia de software e IA para o futuro?


Decisão aumentada “by default” com ADRs assistidos, QA aumentado e testes por risco, arquitetura evolutiva com MLOps leve quando houver modelos, observabilidade preditiva em produção e camadas de governança práticas para uso seguro e orientado a valor.

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Foto do autor

Miguel Ecar

Miguel Ecar é Team Manager na SoftDesign, Bacharel e Mestre em Engenharia de Software pela UNIPAMPA. Especialista em melhoria de processos, transformação ágil e governança de TI. Atua na evolução organizacional e gestão de stakeholders, nos últimos anos tem atuado em projetos internacionais, além de ser palestrante e pesquisador na área. Defensor da colaboração como chave para o sucesso sustentável, busca constantemente aprimorar a qualidade e a eficiência no desenvolvimento de software.

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